Por que estudar Educação Física?
Quando eu fiz faculdade de Educação Física, a primeira pergunta dos professores das disciplinas era: “Porque você escolheu Educação Física?”. A resposta era variada e ao mesmo tempo seguia um padrão entre os colegas de turma: “Amo esportes e sempre pratiquei”, “Gosto da área da saúde e pratico exercícios”, “Nos últimos anos comecei a praticar musculação e agora quero ser personal trainer”, “Quero ser treinador de tal esporte”, “Quero dar aula em escolas”. Raramente alguém falava que gostaria de orientar pessoas à mudança de hábitos e transformação na rotina, melhoria da saúde e bem-estar. Também pouco se falava em ajudar as pessoas a reduzirem o peso corporal.
Considero que essa seja uma das áreas
mais promissoras da Educação Física porque, segundo dados da Organização
Mundial da Saúde (OMS):
·
A obesidade
triplicou no mundo desde 1975;
·
Em
2016 mais de 1.9 bilhão de adultos acima de 18 anos (o que corresponde a 39%)
estavam com sobrepeso e destes, 650 milhões (13%) eram obesos;
·
38
milhões de crianças abaixo de 5 anos estavam com sobrepeso ou obesas em 2019;
·
Mais
de 340 milhões de crianças e adolescentes entre 5 e 19 anos estavam com
sobrepeso ou obesas em 2016;
·
No
Brasil, de acordo com os dados da pesquisa do IBGE, a PNS, 96 milhões de
pessoas, ou, mais especificamente, 60,3% da população adulta do Brasil,
apresentam IMC maior que 25 kg/m², sendo classificadas com excesso de peso.
Se o Brasil tem aproximadamente 208
milhões de habitantes, por volta de 125 milhões de pessoas estão com sobrepeso
e precisam mudar seus hábitos, incluindo a prática de exercício físico
sistemático, planejado e orientado. Portanto, é um mercado amplo.
Fatores
que levam ao sedentarismo
Não é por falta de orientação e informação que essas pessoas estão com sobrepeso e muito provavelmente sedentários ou, no mínimo, pouco ativas fisicamente. Em uma pesquisa realizada pelo Ministério do Esporte em 2013 verificou-se que as pessoas que não praticam atividade física, principalmente, por falta de tempo (58,8%) e preguiça, desinteresse e desmotivação (11,8%).
Redução do gasto energético ao longo dos anos
Um estudo
longitudinal realizado nos Estados Unidos da América (EUA) (Church et al., 2011) estimou um
modelo de equilíbrio energético baseado na mudança no gasto energético diário
relacionado ao trabalho desde 1960 para tentar explicar a mudança real de peso
para homens e mulheres de 40 a 50 anos. Por exemplo, de 1960-1962 até
2003-2006, ou autores estimaram que o gasto energético diário relacionado ao
trabalho diminuiu em 142 calorias diárias em homens. Dado um peso corporal
médio de 76,9 kg em 1960-1962, foi estimada que uma redução de 142 calorias diárias
no trabalho resultaria em um aumento no peso médio para 89,7 kg, o que
correspondeu de perto o peso médio realmente auferido de 91,8 kg em 2003-2006.
Os resultados foram semelhantes para as mulheres.
Portanto, com menos gasto energético no
trabalho e menos vontade e determinação para o exercício físico formal, o que
aconteceria? Aumento da prevalência de sobrepeso e obesidade.
A modalidade, intensidade e volume ideal
de exercício para a redução de gordura corporal ainda não foi totalmente
elucidada. E isso será muito difícil de “cravar” algum dia. Por mais que tenham
profissionais e praticantes defendendo determinados esportes e tipos de
exercício como os mais eficazes para o emagrecimento, a ciência não permite que
adotemos uma postura tão restrita e radical. A prescrição de exercício físico
não é uma ciência exata. Tudo depende!
Há anos o
exercício de intensidade baixa a moderada e de média e longa duração tem sido
recomendado como o principal método para a redução de massa corporal, IMC e
massa de gordura corporal total. Quando prescrito e orientado de forma
planejada e controlada realmente é eficaz.
Apesar das evidências científicas, alguns profissionais
da saúde têm pregado uma perspectiva enviesada de que o exercício aeróbio de
média e longa duração não deve ser aplicado em um programa de emagrecimento e
que o exercício intervalado de alta intensidade é a alterativa mais eficaz,
senão a única. Essa é uma visão distorcida e negligente dos fundamentos
científicos. Vejamos o exemplo desse estudo:
Skrypnik et al., (2015) realizaram dois
modelos de treinamento físico com mulheres obesas de 18 a 65 anos.
·
Os programas duraram 3 meses e consistiram em 3
sessões semanais (às segundas, quartas e sextas).
·
Foram realizadas 36 sessões de treinamento para cada
grupo.
·
O treinamento foi realizado sob a supervisão de um
instrutor de atividade física qualificado e certificado e sob supervisão médica.
Programas:
Grupo A |
Grupo B |
ü 5
minutos de aquecimento (exercícios de alongamento) em baixa intensidade
(50-60% da FC máxima); ü 45 min
de ciclismo entre 50 e 80% da FC máxima ü +5
minutos de ciclismo sem carga ü +5
minutos de exercícios de alongamento e respiração de baixa intensidade. |
ü Força
+ Resistência Aeróbia ü 5
minutos de aquecimento (exercícios de alongamento) de baixa intensidade
(50-60% do HR máximo),
Força
ü 20
minutos de exercícios de força com uma barra nas costas e uma bola suíça
ü Às
segundas-feiras: Os exercícios do membro superior com barra
ü Às
quartas-feiras: exercícios de estabilização da coluna vertebral,
exercícios de recrutamento muscular profundo e exercícios de ajuste de
equilíbrio com uma bola de ginástica
ü Às
sextas-feiras, foram realizados exercícios de membros inferiores
com barra. Os exercícios foram repetidos em série.
ü Entre
as séries de exercícios de força, foram realizadas pausas de 10 a 15
segundos, durante as quais os sujeitos realizaram exercícios isométricos.
Aeróbio:
Logo após os exercícios de força, os sujeitos eram submetidos: ü 25
minutos de ciclismo com intensidade entre 50 e 80% da FC máxima ü + 5
min de ciclismo sem carga ü + 5
minutos de exercícios de alongamento e respiração de baixa intensidade |
|
|
Os autores demonstraram que ambos os
programas reduziram a massa corporal, o IMC, a circunferência da cintura, a
circunferência do quadril, a razão cintura quadril, a gordura corporal total
(%), a massa de gordura corporal (g). Somente o grupo B teve aumento na massa
magra, pois os estímulos foram provavelmente capazes de manter ou aumentar a
massa muscular (isso não foi medido no estudo) e isso aumenta a taxa metabólica
de repouso e auxilia no emagrecimento.
Assim, sugiro que a prescrição de
exercício para o emagrecimento seja baseada em fundamentos técnico-científicos
e em uma anamnese criteriosa perguntando ao aluno/cliente:
· Quais
as suas atividades favoritas?
Você
gosta de ciclismo/corrida/natação/exercícios de mudanças de
direção/saltar/arremessar?
· Você
gosta do ambiente de uma academia tradicional de musculação?
· Você
gosta de treinos que envolvem somente musculação?
· Você
gosta de treinos que envolvem somente ciclismo indoor/corrida na esteira?
· Você
gosta de exercícios com bola, cordas, anilhas, barras, cones?
A partir dessas respostas você pode
elaborar treinos mais variados, estratificando blocos de modalidades dentro e
entre as sessões, a exemplo do aplicado no grupo B no estudo acima. A
prescrição não fica restrita a exercício aeróbio longo ou HIIT ou resistido,
mas sim às necessidades e preferências do aluno, sempre atreladas ao seu
conhecimento.
Não
é uma regra que a sessão tenha que conter somente ciclismo ou corrida, ou
somente exercícios resistidos tradicionais em máquinas e com halteres, ou
somente exercícios funcionais com outros materiais. A prescrição de exercício
moderna contempla a variação, criatividade, inovação, dinamismo e
principalmente interação e coleta de feedback com o aluno/cliente.
A minha missão é produzir conteúdo de
qualidade e inovador que auxilie o profissional a prescrever exercício de forma
eficaz e efetiva. Esse conteúdo é uma prévia do curso “Prescrição de Exercício Físico para o Emagrecimento: Evidências Científicas” que pode ser adquirido clicando nesse link.
Leonardo De Lucca é bacharel em Educação Física, Mestre e Doutorando em Ciências do Movimento Humano pela UDESC. Foi professor da Graduação em Educação Física na UNISUL. É analista de esporte na Fundação Catarinense de Esporte (FESPORTE). Pesquisador na área de fisiologia do exercício.
REFERÊNCIAS
Church, T. S., Thomas, D. M., Tudor-Locke, C.,
Katzmarzyk, P. T., Earnest, C. P., Rodarte, R. Q., Martin, C. K., Blair, S. N.,
& Bouchard, C. (2011). Trends over 5 decades in U.S. occupation-related physical
activity and their associations with obesity. PLoS ONE, 6(5),
1–8. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0019657
Skrypnik,
D., Bogdański, P., Mądry, E., Karolkiewicz, J., Ratajczak, M., Krys̈ciak, J.,
Pupek-Musialik, D., & Walkowiak, J. (2015). Effects of Endurance and
Endurance Strength Training on Body Composition and Physical Capacity in Women
with Abdominal Obesity. Obesity Facts, 8(3), 175–187. https://doi.org/10.1159/000431002
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